A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que entre 2 e 3 milhões de mortes são evitadas todos os anos por conta de vacinas. Por outro lado, o mesmo número de pessoas morre anualmente de doenças que seriam evitáveis por vacinas. Apesar desses dados, têm crescido em muitos países ricos - e também entre as classes mais altas do Brasil - movimentos antivacina, que contestam a eficácia das imunizações, temem supostos efeitos colaterais das vacinas e recusam que as crianças sejam imunizadas.
Vacinas são considerados o principal avanço da medicina. Por meio de campanhas globais de imunização, doenças como poliomielite (paralisia infantil), rubéola e sarampo estão próximas de serem erradicadas em todo o planeta. Além disso, pesquisadores dedicam anos de trabalho para tentar desenvolver vacinas contra doenças infecciosas como a dengue e malária, que afetam e matam milhares de pessoas todos os anos.
Alvos de muitos testes antes de serem liberadas para comercialização, as vacinas não apresentam riscos para a população. No mais, as vacinas mais modernas à disposição hoje são feitas a partir de pequenas partes dos agentes causadores da doença, o que impede que ela, como muitos dizem, seja capaz de desencadear a doença ao qual a vacina pretende combater.
O movimento antivacina não é algo novo. Em 1904, eclodiu no Rio de Janeiro a Revolta da Vacina. A revolta, que durou poucos dias, se iniciou pela recusa da população carioca em receber a vacina contra a febre amarela. A campanha de vacinação, comandada pelo sanitarista Oswaldo Cruz, foi mal explicada ao povo e agentes de saúde entravam nas casas e cortiços sem autorização para vacinar a população à força, abrindo espaço para boatos, inverdades e desinformação. Esse episódio marcante da história do país, no entanto, não guarda relação com os movimentos antivacina atuais e teve suas raízes muito mais na brutalidade policial contra as classes mais pobres do que em temores quanto ao conteúdo e efeitos colaterais da vacinação.
Mais de 100 anos depois da Revolta da Vacina, a recusa em se vacinar atualmente é um fenômeno de membros das classes sociais mais ricas e têm causas bastante diferentes. O primeiro impulso do movimento antivacina ocorreu em 1998, após a publicação de estudo do pesquisador britânico Andrew Wakefield relacionando a vacina tríplice viral (contra caxumba, sarampo e rubéola) com o autismo.
Anos depois, foi comprovado que o cientista havia falsificado boa parte do material utilizando para defender sua tese, mas muitos textos pela Internet ainda insistem em utilizar seu trabalho como prova dos perigos da vacinação entre as crianças.
Além dessa correlação indevida entre vacinação e autismo, os antivacinas também afirmam, sempre baseadas em publicações científicas obscuras, que as vacinas são meios utilizados pelos governos para implantar chips de monitoramento na população ou mesmo promover esterilizações em massa. Em muitos casos, as teorias também apontam interesses escusos da indústria farmacêutica na criação e utilização de vacinas.
Não vacinar seus filhos pode trazer riscos para ele e para o restante da população. A erradicação de doenças passa pela imunização coletiva integral. Uma pessoa não protegida pode ser infectada e contagiar outras, inclusive algumas que tenham recebido a vacina, já que nenhuma imunização tem eficácia de 100%.
Segundo a OMS e outros órgãos internacionais de saúde, o movimento antivacina, que ganha cada vez mais adeptos na Europa e Estados Unidos, coloca em risco a erradicação de doenças e ameaça fazer com que doenças já consideradas superadas ressurjam nestes países.
Recentemente, um surto de sarampo, há anos erradicada nos Estados Unidos, se desenvolveu a partir dos parques de diversão da Flórida. Durante as investigações, as autoridades de saúde do país identificaram uma criança não vacinada que iniciou a circulação do vírus. Nos últimos anos, também tem ocorrido diversos surtos de coqueluche no país, outra doença que era considerada fora de circulação. Em 2014, foram 48 mil casos, maior valor desde 1955.
Baseados em artigos científicos com pouco embasamento teórico - muito deles falsos, como visto anteriormente - e textos apócrifos divulgados na Internet, o movimento antivacina se concentra em países ricos da Europa e nos Estados Unidos. Um estudo internacional mostrou que, por conta de suas ações, algumas cidades do estado da Califórnia apresentam taxas de vacinação similares a de países africanos como o Sudão do Sul.
No Brasil, o pensamento contra o uso de imunizações vem ganhando espaço entre as classes mais altas, mas ainda têm difusão reduzida. Levantamento feito pelo Ministério da Saúde em 2012 revelou que 76% das famílias mais ricas vacinam seus filhos enquanto essa taxa sobe para 81% entre os mais pobres. O movimento antivacina, no entanto, merece atenção também no Brasil, onde muitas campanhas de vacinação têm obtido resultados abaixo do esperado nos últimos anos.
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